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04/05/2020 22h04 - Atualizado em 04/05/2020 22h14
Covid-19: Estudo liga comportamento de Bolsonaro a 10 por cento das mortes no Brasil
Pesquisa indica que presidente pode ter estimulado afrouxamento do distanciamento social
LONDRES — Atos e discursos do presidente Jair Bolsonaro contra o isolamento social como forma de combate à pandemia do novo coronavírus podem estar por trás de pelo menos 10% dos casos e até mesmo de mortes pela Covid-19 registrados no Brasil até ontem. A insistente defesa de Bolsonaro do fim do distanciamento teria afetado o comportamento dos brasileiros, sobretudo nos municípios onde seus seguidores são mais numerosos.
A conta é do economista Tiago Cavalcanti, professor da Universidade de Cambridge, e um dos autores do estudo “Mais do que palavras: discurso de líderes e comportamento de risco durante a pandemia”, divulgado nesta segunda-feira, em parceria com Nicolás Ajzenman e Daniel Da Mata, da Fundação Getúlio Vargas-SP.
Dois eventos em especial teriam provocado um movimento adicional de nada menos que um milhão de pessoas nas ruas pelo país, diariamente, pelo período de 10 dias: a manifestação de 15 de março em Brasília, depois que a Organização Mundial de Saúde (OMS) já havia recomendado o afastamento social, e o pronunciamento, em cadeia nacional, de 24 de março, quando o presidente minimizou a doença, tratando-a de "gripezinha".
Considerando-se o potencial de infecção de cada indivíduo portador do vírus, estes dois atos podem ter sido responsáveis, sozinhos, por pelo menos 500 novos casos por dia. Trata-se de 10 mil infectados num horizonte de apenas 10 dias. Ou seja, cerca de 10% do número de brasileiros oficialmente registrados como portadores da Covid-19 até ontem (domingo).
Cavalcanti reconhece que a conta pode estar subestimada. Isso porque os cálculos levam em consideração apenas os 10 dias subsequentes aos dois eventos e têm por base os casos registrados oficialmente no país. A mesma equação aplicada aos dados de óbitos indica que as manifestações podem estar por trás de pelo menos 700 mortes.
— Não é preciso muita gente para espalhar o vírus. Se esses eventos e discursos não tivessem acontecido, talvez tivéssemos 10 mil casos e 700 óbitos a menos — disse Cavalcanti ao GLOBO.
Monitoramento de celulares
O documento monitorou 60 milhões de aparelhos celulares, sem a identificação dos donos, em todo o Brasil, e confirmou que as palavras do presidente têm, sim, efeitos para muito além da retórica. Os dados ainda são preliminares e serão constantemente atualizados, o que significa que, em breve, deverão computar também o impacto da manifestação do último domingo.
O estudo comparou o índice de distanciamento social com os resultados nas urnas em 2018 em 5.570 municípios, sobretudo naqueles em que o presidente recebeu mais ou menos 50% dos votos no primeiro turno. A diferença no grau de isolamento das pessoas nas cidades onde há mais apoio a Jair Bolsonaro variou em até 30%.
"Nos 3% dos municípios onde o presidente teve o maior número de eleitores, como em Ascura, em Santa Catarina, e Nova Santa Rosa, no Paraná, o isolamento social subiu 24 pontos percentuais. Mas em Paricoa, Alagoras, e Irapuan Pinheiro, no Ceará, por exemplo, onde registrou o menor percentual de votos do país, o indicador aumentou 31 pontos percentuais”, diz o documento.
Paradoxalmente, pontua Cavalcanti, o discurso deletério do presidente acaba por prejudicar, em primeiro lugar, seus próprios eleitores, já que são eles que se sentem mais encorajados a sair de casa em plena pandemia.
Os atos e a retórica de Bolsonaro só complicam um cenário de muitas dúvidas sobre o novo coronavírus no Brasil, de acordo com o especialista.
— Existe muita confusão e desorganização no plano de ação do Brasil, além de muitas incertezas sobre o grau de letalidade e infeçção do vírus. Por isso, é tão importante o que diz o presidente na pandemia. Mas o discurso do governo é antagônico dentro do próprio governo, e não apenas em relação ao que dizem os governadores. É o papel do líder mostra-se como fiel da balança— disse Cavalcanti
No início da pandemia, quando os primeiros casos começaram a ser revelados no Brasil, as pessoas responderam ao isolamento social de maneira mais imediata. O universo da população que deixou de circular passou de 20% a 50% em média ao longo do tempo. Esta foi a fração dos celulares que permaneceram em um raio de até 450 metros de distância de casa, de acordo com o estudo. Mas a resposta foi desigual pelo país:
— Nossa pesquisa sugere que as declarações sobre comportamento de saúde pública são levadas a sério pelos seguidores, a despeito do seu rigor científico ou da sua capacidade de causar danos — afirmou Cavalcanti, que foi além:
— Bolsonaro desafia ativamente as regulações impostas pelos governos regionais para conter o vírus. Ele ignora as recomendações da OMS e até mesmo do seu próprio ministro da Saúde (Luiz Henrique Mandetta), que foi demitido recentemente.
Para Cavalcanti, a pesquisa realizada com base em "big data" mostra que a atividade do presidente tem efeito sobre a população.
— O Brasil é uma nação polarizada com um líder populista. Os padrões que vemos no Brasil poderiam se repetir em nações com uma situação politica semelhante, como nos Estados Unidos — diz o economista.
Foto: Agência Brasil
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Comentários
perfeito Alberto, e eles ainda esquecem que o lula quebrou o país bancando o messias latino americano, o deusinho que essa gente hipócrita cultiva.
Joca - 27/07/2020 22h29
Os professores doutores estão errados. As doenças e pragas que matam a maioria dos brasileiros vêm dos esgotos a céu aberto e da qualidade da água, ambos entregues a mais da metade da população. Um estudo sério seria verificar a quantidade de mortos que têm como causa a falta de saneamento básico. Isto não interessa aos doutores esquerdopatas.
Alberto Diniz - 14/07/2020 16h58