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16/03/2024 21h05

NÃO É MOMENTO DE PASSAR PANO

Paulo Schultz Paulo Schultz
Professor
Há, suavemente no ar,  uma movimentação em curso, vinda de dentro das forças armadas, para preservar seu status de poder, e  recuperar a sua imagem no país, em função da sua participação escabrosa no governo Bolsonaro,  e, principalmente,  pela suspeita e indícios fortes de participação (ou conivência )de parte das forças armadas na tentativa de golpe após a derrota de Bolsonaro em 2022. 
 
Dia após dia, nas últimas semanas, parece ficar mais nítida essa movimentação.
 
Figuras do comando das forças armadas à época do governo Bolsonaro ( com concordância, ao que parece, do restante da cúpula militar ativa , resolveram falar o que sabem em depoimentos à Polícia Federal, e assim fulminar Bolsonaro e sacrificar um punhado de graúdos das forças armadas, todos na banha quente que punirá a tentativa de golpe que visava invalidar as eleições, impedir Lula de assumir, e estabelecer uma ruptura institucional antidemocrática.
 
Sabe o que parece isso ? É suavemente propor uma espécie de uma anistia velada, que não seja criada por lei, mas sim executada em modo silencioso, em um acordo.
 
Quer dizer....eles oferecem a cabeça de um punhado de gente graúda das forças armadas, além do próprio Bolsonaro, e em troca as investigações e as punições poderiam parar nesses que serão atirados na banha para fritura e condenação.
 
Assim, se daria uma resposta institucional e uma satisfação  à parcela majoritária da sociedade que condenou a tentativa de golpe, e que quer seus responsáveis punidos.
 
E, ao mesmo tempo, se preservaria o status quo de poder das forças armadas,  e lhes daria margem para recuperar a sua imagem altamente prejudicada, por conta de sua participação no governo Bolsonaro, e das movimentações golpistas pós eleições.
 
Os grandes órgãos de mídia do país ... Globo, Folha de São Paulo, Estadão,  entre outros, parecem já ter encampado a ideia, e tem ajudado a encorpar a divulgação das declarações e dos depoimentos dados por estes altos militares à PF, fritando alguns militares e Bolsonaro. Perceberam isso nas últimas semanas?
 
A ideia parece boa....para as Forças Armadas, essencialmente, mas.... precisa ser combinada e ter a concordância do governo federal,  e do judiciário , para vingar.
 
E aí....  STF e o governo federal estariam dispostos à ela?
 
Isso significaria uma anistia branca,  velada... e um enorme passar de pano.
 
Punir alguns... e passar pano para os demais.
 
Uma conciliação conformista. Uma punição meia boca.
 
Cabe isso no momento? Não.
 
A hora é de investigar, indiciar, processar e punir todos os responsáveis ou coniventes pelas movimentações e atos golpistas, sem exceção.
 
Militares das três forças... Exército, Aeronáutica e Marinha, que tenham tido participação maior ou menor na tentativa de ruptura.
 
Empresários e gente do agronegócio.
 
Parlamentares e outros detentores de cargos políticos.
 
E também, evidentemente, o próprio Bolsonaro e a cúpula do seu governo.
 
Enfim ....todo mundo que teve participação ou conivência nas movimentações que culminaram no dia 8 de janeiro de 2023.
 
Dizem que ferro se molda enquanto está quente.
 
Pois bem,  esse é o momento histórico e uma oportunidade talvez única,  que o Brasil tem de colocar as forças armadas dentro do seu devido lugar e da sua função constitucional.
 
Aproveitando as investigações e as participações de militares na intentona golpista,  e punindo exemplarmente aqueles que comprovadamente estiveram implicados nas movimentações, teremos uma delimitação pedagógica de dizer para o todo das Forças Armadas que não mais se atrevam a nenhuma aventura golpista, que se coloquem no seu lugar constitucional,  que não mais flertem,  usando qualquer circunstância política,  com esse devaneio, essa  deturpação oportunista de artigo 142 da Constituição,  e de ser "poder moderador" da República.
 
Não o são, e nunca foram.
 
Para uma república que nasceu a partir de um golpe militar que destituiu a monarquia,  e que tem em sua história vários episódios de tutela e golpe militar,  tá na hora de encerrar o trauma, e  colocar uma pedra democrática em definitivo sobre isso.
 
Não é hora de passar pano para militar nenhum.
 
Que sejam colocados no seu devido lugar constitucional, e ponto.
 
Que as investigações aconteçam até o fim, por todos os meandros...e todos os que forem implicados nas movimentações que queriam ruptura democrática sejam punidos, pedagogicamente.
 
É isso.

 

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