Colunas / Cultura
11/02/2024 11h03
SEM COAÇÃO, SEM AMEAÇA, SEM CHANTAGEM
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Paulo Schultz
Professor
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Luciano Hang e as lojas Havan foram condenados a pagar mais de R$ 85 milhões por coagir funcionários a votarem em Bolsonaro na eleição de 2018, e a participarem em “atos cívicos” da empresa.
A ação foi movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) . O esquema de Hang para coagir funcionários incluía mapeamento da posição política de cada um dos 15 mil empregados da sua rede.
Eleição de 2022 -- Stara - O Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) ajuizou ação civil pública contra a empresa com sede em Não-Me-Toque, no noroeste do Rio Grande do Sul, após o primeiro turno das eleições.
Na ocasião, a procuradoria de Passo Fundo recebeu notícias de fatos coercitivos por parte dos dirigentes da empresa. Conforme as informações do processo, textos, áudios, imagens e vídeos causaram apreensão entre os empregados e fornecedores, pois indicavam que haveria redução de produção caso o resultado das eleições fosse contrário ao propagado pela empresa (a empresa estava forçando voto em Bolsonaro).
Mensagens de WhatsApp mencionaram, ainda, potenciais dispensas e redução da folha de pagamento. As informações do processo também indicaram a distribuição de kits de propaganda eleitoral e a realização de atos político-partidários em filiais da empresa.
A empresa foi condenada a pagar R$ 1,5 milhão de indenização por danos morais coletivos.
São dois exemplos recentes, de empresas de grande porte, com alto número de empregados, e que usaram da sua condição de poder econômico para forçar o voto em seu candidato - no caso, Bolsonaro.
É sabido que essa prática foi forte em 2018, na eleição de Bolsonaro.
Foi muito forte em 2020, nas eleições municipais, quando o poder econômico local, em grande número de municípios do país, forçou o voto em candidaturas alinhadas com seus interesses, e , paralelamente, alinhadas com o bolsonarismo.
E foi prática quase generalizada nas eleições de 2022, na tentativa de coagir, ameaçar, amedrontar e cabrestear o voto de milhões de trabalhadores e empregados, em Bolsonaro, principalmente.
Por óbvio que uma minoria dos casos foi tornada pública, ou tornada denúncia, por conta do natural medo de trabalhadores e trabalhadoras, que estavam em uma condição onde os seus empregos e suas subsistências estavam sob ameaça.
Mas as conversas correram pais afora, à boca pequena , em milhares de cidades - funcionários da indústria X, empregados do agro Y, "colaboradores" da empresa Z, etc , sendo coagidos, chantageados, amedrontados.
Uma escala nunca antes vista de coação e chantagem.
E se temos essas punições de Luciano Hang e da Stara como exemplo, que as mesmas sirvam de parâmetro para o comportamento decente que os donos do poder econômico devam ter nas eleições municipais deste ano de 2024.
O poder econômico nas cidades pode até tentar, mas não pode ditar, nem o andamento, e nem o resultado de eleições..a ponto de definir o eleito por coagir milhares de trabalhadores e funcionários a votarem nos candidatos dos seus interesses.
É difícil de pôr esta vigilância para cima do poder econômico ? Certo que é. A gente sabe que existe, por vezes, complacência institucional dentro dos municípios em função do peso do poder econômico.
Bem, existe o aparato público institucional da Justiça Eleitoral , do Ministério Público, e também do Ministério Público do Trabalho, mas nem sempre estes tem alcance, ou poder de fogo suficiente contra grupos locais.
Mas há mecanismos possíveis.
Em primeiro lugar, é preciso que qualquer trabalhador ou trabalhadora tenha a possibilidade de fazer denúncias anonimamente, com direito a garantia de segredo, sempre que algum tipo de coação, chantagem ou ameaça estiver sendo feita em qualquer local de trabalho.
Em segundo lugar, é preciso que as instituições montem uma força tarefa, que necessariamente não esteja sujeita a pressões locais, para que possa receber denúncias e ter a potência de ação suficiente para investigar, e caso comprovada a ilicitude, fazer cessar de imediato a coação ou ameaça, e punir pesada e exemplarmente, quem quer que seja, independente do seu poderio econômico.
Fora do âmbito institucional, é preciso que organizações e entidades da sociedade se disponham também a acompanhar as disputas locais deste ano, e, caso necessário, se ponham a dar suporte e encaminhamento a denúncias de abuso de poder econômico para cima de trabalhadores no período eleitoral.
E, por fim, é vital uma vigilância diuturna de atenção minuciosa e consequência, do conjunto de partidos que têm compromisso com a democracia, que têm compromisso com uma sociedade justa, que não têm ligações umbilicais com o poder econômico, e que querem que cada cidadão / cidadã tenha seu direito livre de voto, sem chantagem ou coação.
Que 2022 tenha sido a última vez que tivemos essa ação do poder econômico nessa magnitude contra milhões de brasileiros.
Nestas eleições municipais de 2024, o tom da conversa tem que ser diferente com o poder econômico.
Ou praticam um comportamento decente, ou têm que sofrer punição pesada e exemplar.
Para arregaçar, para fazer parar de imediato a chantagem ou coação, para que o resultado das eleições seja o espelho da vontade da maioria, e não da vontade de um grupo pequeno que detém o poder econômico nos municípios.
Papo reto . E passa a régua.
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