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06/09/2020 10h17 - Atualizado em 06/09/2020 12h19
Exaustão, ódio, desalento e a inadiável luta
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Paulo Schultz
Professor
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Madrugada.
Rolando a tela pelo Facebook, encontro um vídeo - uma gaita que emana uma canção melancólica, tocada por uma jovem.
Trabalha em um hospital. Está vestida com roupa de trabalho, provavelmente em horário de descanso. E nesse tempo, sentada sozinha em um quarto, aparentando cansaço, toca gaita ponto baixinho e reflexivamente.
Notas suaves, melodia triste.
Nas notícias do dia, o preço impeditivo dos alimentos básicos, como arroz e feijão, dificultando a vida de milhões de brasileiros. Lembra a carestia, a fome - condição crônica do Brasil das décadas de 80 e 90.
As mortes pela pandemia vão gradativamente se "naturalizando" na cabeça da população, e ultrapassam 126 mil brasileiros até aqui.
Bolsonaro e seu governo propõem uma reforma administrativa que arrebenta com o serviço público.
Os incêndios criminosos na Amazônia aumentam, com a cumplicidade omissa do governo federal.
O Brasil de 2020 é um país exausto.
É consequência de uma crise social, política e econômica que vem se agudizando desde o início de 2015.
E que agregou um elemento destruidor - o ódio.
Há um contingente de milhões de brasileiros que empobreceu, se enbruteceu, se enraiveceu, se entristeceu.
Mesmo quem hoje se acha empoderado, porque seu "Messias" está no poder central do país, não demonstra alegria - demonstra raiva e ódio - fundamentalista e ignorante, por sinal.
O país, entre outras coisas, tem parte considerável de seu povo triste, desesperançoso.
Lembra que há cerca de 10 anos éramos um dos países com população mais feliz, orgulhosa e confiante no seu futuro ?
Revistas de circulação nacional estampavam isso em suas capas.
O Brasil de agora tem 40 milhões vivendo de bico, na informalidade.
Tem cerca de 13 milhões de desempregados.
A pobreza extrema avança.
Milhões tem no auxílio emergencial sua maior renda- ou única - no mês.
O Brasil de 2020 carrega sintomas brutos e crônicos de preconceito e desigualdade, agravados pela política diária de fomento ao ódio.
É necessário desatar esse quadro,sob pena de rumarmos para a desagregação e a barbárie social (um quadro de anomia que interessa a poucos).
Tarefa dura, mas necessária.
Começa nas relações humanas, que requerem solidariedade com quem está vulnerável.
Passa pelos municípios, onde tudo acontece e aflora, e onde a esteira de fundamentalismo e ódio precisa ser travada por governos locais comprometidos com a cidadania e desenvolvimento distribuidor de renda.
Já disse outras vezes - o bolsonarismo é um sintoma de uma sociedade adoecida.
Ele não é todo o problema - mas ele agrava o quadro, porque enbrutece, desumaniza, desorganiza e seduz para o ódio destrutivo.
É isso que precisamos enfrentar.
Nos versos de uma canção...
" A vida não tá fácil, não
É muito prato prá pouco feijão
É muito ódio no coração..
Mas sei,
Que tudo pode ser melhor
A gente vai desatar o nó,
A gente vai voltar a sorrir"
À boa e inadiável luta.
Este artigo é de responsabilidade exclusiva do seu autor, não representando necessariamente
a opinião do portal.
Comentários
O Brasil pandemico de 2020 é mesmo um país exausto como dissestes. E tocastes também numa problemática fundamental - há além de um empobrecimento de parte da população, que vê agora no auxílio emergencial a única saída pra não passar fome, também o embrutecimento e raiva coletiva.
Se estão tristes, não sei, mas não consigo acreditar que estejam felizes, pelo menos não é a "boca escancarada cheia de dentes" que está estampada nas grandes mídias, nos grandes jornais, sejam eles virtuais ou físicos.
Estamos rumando à barbárie social e do jeito que está eu acho que vamos chegar lá, Paulo.
E já que terminastes teu artigo com letra de música, que considero otimista, termino meu comentário com outra letra, bem mais realista, que eu acho que serve para o que estamos vivendo e contempla teu texto. É você merece, ou Comportamento Geral, de Gonzaguinha, que também fica ótima na voz de Elza Soares:
"Você deve notar que não tem mais tutu
E dizer que não está preocupado
Você deve lutar pela chepa da feira
E dizer que está recompensado
Você deve estampar sempre um ar de alegria
E dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão
E esquecer que está desempregado
Você merece, você merece
Tudo vai bem, tudo legal...".
Rose Bitencourt - 06/09/2020 21h11
Muito bom e verdadeiro o texto,me questiono todos os dias,onde estava escondido todo este ódio que agora aflora em nome do mito,que de mito não tem nada. Sempre fomos oposição, menos poucos anos em fomos governo, mas nunca destilamos ódio como está gente,sinceramente tenho pena deles.
Helena - 06/09/2020 16h51
Muito bom! Um texto ácido e poético ao mesmo tempo.
Ana Maria de Oliveira - 06/09/2020 14h31